sábado, setembro 29, 2007

Fundamentalismos

É com enorme pesar que venho acompanhando a querela entre o vereador João Parreira de Miranda e a Secretaria Municipal de Cultura do município de Bauru, personificada no secretário municipal José Augusto Ribeiro Vinagre. Sei que para muitos munícipes tal desavença passaria sem maiores conseqüências, além das farpas políticas de costume. Mas o caso me parece criar um bom momento para que pensemos a relação que os representantes do povo têm com a coisa pública em nosso país.

Antes, é preciso que a Constituição Federal seja trazida à mesa, afinal os vereadores tem garantida sua inviolabilidade por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município. Traduzindo em miúdos, o que um vereador fala, numa tribuna, dentro de uma casa legislativa, não pode, em principio, ter conseqüências penais, afinal, ali, naquele instante, está encarnado o Representante do Povo, soberano, o qual o elegeu. Assim, o Representante fala, em tese, por todos.

Mas, tais inviolabilidades constitucionais (prerrogativas do cargo que visam defender a democracia) não nos impedem de analisar o ponto central da discussão (retirando-se dela o caráter eventual de ilegalidade em contratos, de improvável constatação objetiva, haja vista a subjetividade da arte). Afinal: o que é arte???

Evidentemente isso não será respondido aqui, pela simples razão de que esta questão (ao contrário do que parece imaginar o nobre vereador) não tem resposta. Pois qualquer tentativa seria tão ridícula quanto perguntar: “quem estava certo: Picasso ou Michelangelo?” Se quiserem, tentem respondê-la.

Na mesma linha, devemos nos lembrar da essência da proteção constitucional de inviolabilidade de que se vale a vereança, cuja função precípua é proteger a sociedade dos totalitarismos, censuras, protegendo assim a diversidade de idéias e expressões. É a própria liberdade de expressão que permite que vereadores discorram sobre temas acerca dos quais entendem tanto quanto a maioria da população entende de fissão nuclear à frio. Mas todos podem se expressar.

Por fim, gostaria de relembrar a todos que a mesma obscuridade humana capaz de dizer que “isto é arte! Aquilo, não!” é a que pode, a qualquer instante berrar o canto fundamentalista: “este é um Deus! Aquele, não!”, ou até mesmo “esta é a verdade! O resto, não!”.

Thiago Azevedo Guilherme

RG: 43.467.592-1

OAB/SP 250.301