domingo, março 27, 2005

Surfing since then....


Pessoa, luz, teclado, letras, tela, cursor, dedos, tapete, som do ônibus em baixo da janela. Partes do tudo do agora. Todas essas coisas, pedaços de sensações criadas pelos cinco sentidos. Cinco ate agora conhecidos, percebidos e já nomeados, rotulados. Informações, energia processadas pelo computador (ou a soma dos computadores) dentro da caixa craniana. Cinco sentidos estimulados pela energia. Somente energia, em varias formas, padrões e intensidades estimulando os cinco e criando a minha sensação de eu mesmo. Não! As sensações não são em si só, somadas, eu. Eu “sou” também, em parte, onde elas são processadas. Tudo somado. Rota e trafico. O caminho e a energia que por ele flui. Energia e matéria.
Isso soa simplista demais? Pretensioso? Para alguns sim. Para outros não. Seria isto então cético demais? Desprovimento de transcendência ou abuso quase irresponsável dela. Literal viagem. Pode parecer ateísta demais. Talvez o seja. Creio que não.
Não por que vemos, ouvimos, tateamos, saboreamos, cheiramos com o cérebro. Estímulos de sensações nas células sensoriais. Ilusão cerebral, portanto. Caso pudéssemos “ver” o fluxo de energia, conheceríamos a “realidade”. Compreenderíamos, talvez, as menores partes, os átomos, o fluxo de energia nas esferas elétricas e os elétrons girando inexoravelmente em torno de seu núcleo. Mudando sua velocidade, sua posição, sei lá, sua tendência a ser algo. Fluindo pelo universo. A ordem, a sincronicidade mantida, mas a energia fluindo, garantindo a vida, a persistência da vida. Assim, com estes olhos nos veríamos como uma conseqüência desse fluxo. Nós e nossa consciência. Nossa soma de sentidos (haja quantos houver, serão enfim energia mais ou menos “condensada”). Pode ser. Nós saberíamos enxergar que somos ainda parte do todo. Afinal, mantemo-nos inteiros, não nos diluímos no todo com nossa consciência. Mas sabemos que somos conseqüência dessa soma de tudo e mais um pouco.
Se pudéssemos nos ver assim, compreenderíamos que matéria por onde flui energia, tem vida em alguma acepção do termo. O mundo e seus habitantes vivem por que usam dessa energia dissipada lá no começo. Pode ser no Big Bang. Essa energia que ainda flui, pelos seus caminhos sincronizados. E tendo vida, teria uma espécie de consciência também. Não necessariamente uma consciência como a nossa. Talvez ate sem a noção do “eu”. Por essa visão, nosso planeta também estaria vivo. Talvez também tivesse consciência. Consciência de si mesmo.
Chamariam-me de evolucionista então. Já não sei mais. Acredito que nossa consciência é fruto de uma evolução sim. Dos macaquinhos sim. Das amebas também. Mas que macaquinhos e amebas também tenham suas consciências. E toda aglomeração organizada por uma estrutura de DNA também tivesse algum tipo de consciência. E ao retrocedermos ao todo. Ao instante inicial. Imediatamente anterior a Big explosão inicial, aquela soma do tudo, concentrada em um espaço do tamanho da cabeça de um alfinete, talvez tivesse a consciência do que estava prestes a fazer. Desintegraria-se no todo, sendo o todo e tendo noção do que fazia.
Sempre que imaginamos uma visão criacionista do universo imaginamos uma religião com um Deus Onipresente, Onipotente, e Onisciente e que, alem de criar tudo fica (ao que parece) mudando as regras do jogo com os times em campo. Traços humanos atribuídos as divindades, como na mitologia. Mas se as regras estivessem estipuladas, e nada as pudesse mudar nem nada as influenciasse. A nós coubesse somente o aproveitamento dessa energia em vias de estabilizar-se. Caminhamos todos sobre essa energia. Somos surfistas do universo em cima da onda do Big Bang, da qual nos alimentamos. Podemos deitar e rolar sobre a onda apenas tendo cuidado para não nos afogarmos.