sexta-feira, dezembro 16, 2005

Para Lennon e MacCartney

Na semana passada o assassinato de John Lennon, morto pelo fã desequilibrado Mark Chapman, completou 25 anos. O jornais transmitiram matérias especiais sobre o acontecimento, alguns canais veicularam documentários sobre a vida do ex-beatle, sobre seu relacionamento com Yoko Ono, sobre sua relação conturbada com Paul McCartney, enfim, sobre a vida, obra e morte deste homem que foi comparado a Ghandi em seus últimos anos de vida. E era o mínimo que se podia esperar para tal data. Como todos os anos, uma multidão de fãs passou em frente ao Edifício Dakota, cenário daquele fatídico 8 de dezembro. Flores foram deixadas e jovens caminharam por sobre a inscrição “imagine” que se encontra na calçada do Central Park, do outro lado da rua. Viu-se assim que o mito “John Lennon” ainda sobrevive, talvez pela conveniência de sua mensagem pacifista nos dias atuais, talvez pela anistia conferida àqueles que se consagram como mitos.
Entretanto...qual a verdadeira dimensão da obra deste homem que teve sua vida abreviada em decorrência da aliança entre sua notoriedade e a insanidade alheia? O que fez um astro começar a pregar tão veementemente um distanciamento pacífico justamente do sistema do qual os Beatles eram produto?
Em primeiro lugar devemos deixar claro que os Beatles foram e sempre serão os únicos Beatles, assim como Pelé é Pelé, como Platão foi Platão, como Napoleão foi Napoleão. São inresumíveis, únicos, fenômenos (literalmente, pois são frutos de combinações imprevisíveis entre os indivíduos e o momento), são paradigmas, e, como conseqüência, acabam por se tornar seres míticos, que extrapolam nossa racionalidade. Os Beatles aglutinaram em si (tornando-se causa e efeito) uma quantidade assombrosa de mudanças comportamentais e de pensamento na sociedade, sendo o estopim para um ataque ao establishment da histeria e da postura de meninas de família, mas sendo também um produto muito bem trabalhado da indústria cultural e de comunicação de massa. Ressalte-se que o fato de serem um produto não faz deles uma farsa, afinal foram os primeiros, e eram bons mesmo no que faziam. Mas, enquanto produto, eram fruto de todo um sistema, ao qual Lennon dedicou a parte insabidamente final de sua vida a questionar. Meio Jekil e Hyde mesmo.
Lennon fez com que os Beatles se acabassem, diligentemente auxiliado por Yoko e pelos egos inflados dos companheiros de banda. É notória a desavença entre Lennon e McCartney após o fim do grupo. Eles se alfinetavam publicamente, sem medo. O engraçado é ver as letras de John Lennon em sua fase solo e perceber que não condiziam com a postura que mantia diante dos ex-companheiros. Também é evidente a queda na qualidade das músicas de Lennon nessa mesma fase. Musicalmente Lennon não era tão Lennon sem o Beatles.
A personalidade de John Lennon fica ainda mais enevoada quando observamos uma de suas mais famosas canções na fase “Yokoholic” de sua breve vida: “Imagine”, a mesma palavra da calçada do Central Park e que ficou imortalizada pelo piano branco de Lennon. Trata-se de uma canção interessante que toca o coração de quem houve por tratar de assuntos que respondem a necessidades e anseios do ser humano. Mas a música propõe uma busca da paz por uma via de negação de tudo que existe. Na letra, Lennon imagina um mundo sem paraísos, sem inferno, sem países, sem religiões, sem ideais, imagina uma vida focada no aqui e agora. Mais paz e amor impossível. Isso, vindo de uma pessoa que fez fortuna às custas de uma imagem criada pela indústria e pelo sistema acaba parecendo má-fé. Ou então, o que é mais provável, um surto pacifista induzido por opiáceos (eu to falando de heroína). A política de negação de tudo de Lennon, juntada à proposta de ficar numa cama o tempo todo é egoísta. Teve ressonância porque ele era John Lennon. Senão seria tratada como atitude de um lunático. Eu ouço os Beatles, gosto deles, são geniais, mas daí a enxergar nas palavras de Lennon algo mais do que boa música, pra mim é um pouco muito.

3 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Thiago, foi um prazer imenso te conhecer e ler os seus textos. Você é uma pessoa profunda em suas idéias. Dificilmente, encontramos pessoas como você, com seu nível de conhecimento e interessadas pelo que se passa no mundo. Suas críticas são interessantes e suas idéias são construtivas. Elas merecem ser passadas para as pessoas. Continue a escrever.

10:38 PM  
Anonymous Anônimo said...

Incrível!!! Você escreveu no seu post tudo o que eu sempre quis dizer sobre eles...Fazia um tempo que não passava por aqui...e adoreeeei!!! Parabéns...

3:04 AM  
Blogger Ana Carolina Magalhães said...

Olá Thiago!
Quanto tempo!
Gostei muito deste texto. Outro dia vi o clipe de Imagine e fiquei mesmo afetada, no meu caso de uma maneira idealizadora, vc me conhece, pensando que queria tb um mundo e um amor assim!
Quem sabe um pouquinho só neh?
Vou passar a acompanhar seu blog!
Beijo da sua amiga Carol (Bauru/São Paulo/Ribeirão)

10:46 PM  

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